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sexta-feira, 18 de março de 2011

Ron Johnny – Revelação sobre uma vida

Já não sei mais onde consegui chegar e nem mais o que posso provocar. Entre drogas, sexo, rock’n’roll e solos de guitarra, perdi-me em um abismo da qual não consigo mais voltar. Motivos? Não existem motivos, apenas a louca ansiedade por quer me aventurar.
Tenho 26 anos aparentando um sujeito da qual poderia, ou até deveria estar internado em uma clínica de reabilitação e, às vezes me perguntam por que não procurar o mesmo e respondo, com um ar de fraqueza, que é pelo simples e triste fato de não conseguir chegar até lá.
Nasci em 1965, em um pequeno vilarejo da cidade de Rockford, nos Estados Unidos. Por lá morei até meus 14 anos, onde me batizaram pelo nome de Ron Johnny - dizem meus pais que se inspiraram em uma marca de roupa – e logo após fui morar na capital Chicago.
Até meus 14 anos vivi momentos de pobreza e angústia. Tendo nascido em um pequeno vilarejo, não conheci mais do que 20 pessoas que moravam na vizinhança. Meu pai na época encontrava-se sem dinheiro, o que trazia dificuldades financeiras para dentro de casa, minha mãe sempre cuidava da casa e tentando conseguir alguma coisa, eles sempre rezavam para um Deus lhes darem as necessidades básicas, o estranho que sempre reparei é que nunca ganhava-mos nada. Cansado de sempre presenciar a mesma vida monótona de pobreza e de enganação por um Deus que nunca conheci, sai de casa com 14 anos e fui morar em Chicago, onde poderia conhecer pessoas novas, coisas novas, uma cidade nova e tentar me aventurar ao máximo naquela imensa capital.
Entre caminhadas e estradas cheguei ao local que tanto esperava, a grande Chicago, o lugar onde realizaria meu sonhos, onde poderia conhecer, me espiritualizar, experimentar do que tantos diziam ser bom, a vida. E como não fosse tanta sorte, arrumei um emprego no meu primeiro dia na cidade, trabalhando como atendente em uma mercearia e, por lá mesmo consegui moradia em um pequeno quartinho que o dono do estabelecimento sedia aos novos empregados que chegavam de novas cidades. Lá pude ter agradável sensação de poder ter meu próprio dinheiro, minha própria vida.
                Ao lado da mercearia havia uma loja de instrumentos, em que todo dia no meu serviço podia se escutar as várias batidas suaves da bateria, o afinado solo de uma guitarra e o dedilhado inigualável do teclado, com isso passei a tomar gosto pela música e sempre que podia ia ver os instrumentos à venda e os rapazes tocando. Em pouco mais de três meses juntei meu dinheiro e comprei uma guitarra e conhecendo novos amigos na noite montei uma banda onde tocava-mos rock-blues. A banda se chamava The Revelations e passamos a fazer shows em bares e boates. Com todos esses shows pude conhecer aquilo que nem esperava existir, algo que me abrira de tal forma da qual nem eu sabia que podia acontecer, a chamada maconha foi a primeira droga que experimentei e com absoluta certeza fez diferença em minha vida.
                Por entre outros caminhos e novas cidades, com um pouco mais de idade, já com 17 anos, já tinha passado por várias experiências, como: maconha, cocaína, LSD, ácido lisérgico, anfetamina, metadona, heroína, enfim, entre outras drogas que acrescentaram em minha vida, ao meu modo de pensar, conhecimentos da mente que então não sabia que existia, pude me aprofundar em mim mesmo, conhecendo muito mais do meu ser. Já produzindo músicas novas, gravamos nosso primeiro disco, com o título The Revelations e estávamos nas paradas de sucesso com a música “Real Abstract”. Então fizemos uma turnê do disco pelo país, que foi onde comecei a fazer uso compulsivamente da heroína.
                Conheci uma garota chamada Alice em um dos shows que fazíamos em Nova York, que até atualmente estou casado com ela, foi a pessoa com o qual mais me identifiquei e com passar dos anos gravamos mais três álbuns em estúdio e cinco ao vivos.
                Já com 23 anos me internei em uma clinica de reabilitação para fazer os gostos de Alice. Em 1990 retornei à banda e gravamos mais dois discos, fazendo turnês mundiais agora. No entanto, entre uma turnê e outra eu fazia o uso da heroína em pequenas quantidades para me dar animo para tocar nos shows e foi assim que cheguei até hoje, 1991 viciado novamente em heroína, mas agora com problemas mais graves, depressão, câncer no coração e, em estado de vegetação em uma cama deitado escrevendo essa autobiografia de quem nem sei quem sou ou quem fui e,  eu meu pergunto, com um tom de tristeza de não poder voltar atrás, porque sai de perto dos meus pais naquele pequeno vilarejo de Rockford?  E me respondo que não foi para me aventurar, como dizia antes e sim para me matar.
                Hoje estou aqui, no dia 7 de agosto de 1991, deitado em uma cama não sabendo se vou morrer hoje ou amanhã ou simplesmente em um dia qualquer que seja próximo, só sei que em minha vida que por mais que seja bom, divertido, agradável, toda aventura extrema causa morte, o porquê disso, não sei. Aliás, pra que saber, são com erros que descobrimos os fatos.
                Disseram-me um dia que a maior beleza da vida era a própria vida e hoje vejo que a vida só é bela sabendo administrá-la, foi o que não soube fazer. Mas mesmo assim não me arrependo de ter feito o que fiz, sem essas coisas não seria o grande Ron Johnny que virei, só sei que, por não ter administrado minha própria vida, estou hoje, sendo o velho Ron Johnny de 26 anos deitado em uma cama, com meu corpo violado pelo meu próprio ser esperando o dia de minha morte chegar.

                “Ron Johnny morreu no dia 21 de setembro de 1991 vítima de infarto fulminante. Seu corpo foi enterrado no pequeno vilarejo em Rockford, onde nasceu e na lápide encontra-se a frase que serviu de motivo para a vida dele: ‘Só quero ter a louca ansiedade por querer me aventurar’”


Gustavo Machado.

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